Direcionamentos Triádicos

Um ensaio sobre a estrutura fundamental dos subtipos do Eneagrama sob a perspectiva dos "direcionamentos triádicos" (apresentados por Naranjo em "Ensaios Sobre a Psicologia dos Eneatipos")

O que aqui chamo de “Direcionamentos” ou “Orientações Triádicas” deriva da leitura da proposta das “tríades implícitas” dos Eneatipos, apresentada por Naranjo em seu livro “Ensaios Sobre a Psicologia dos Eneatipos”.

No entanto, aqui desenvolvi uma percepção mais padronizada a respeito do funcionamento dos “subtipos” do Eneagrama. Deste modo, proponho que as variantes emocionais têm uma abertura à paixão, enquanto as intelectuais estão convictas a partir de sua fixação e, por último, as ativas têm foco no mecanismo de defesa. E claro, apenas isso não basta para entender os subtipos, mas serve para direcionar o estudo dos mesmos. O objetivo aqui é desviar de um foco em traços característicos para atingir uma visão mais fundamental e precisa no que diz respeito à estrutura dos Eneatipos. A fim de facilitar a compreensão, confira o índice abaixo (confira os Eneagramas das Paixões, Fixações e Mecanismos de Defesa no caminho Eneagrama → Imagens → Eneagramas):

N/A: A razão pela qual priorizo a compreensão dos direcionamentos triádicos em vez das variantes instintivas é porque, quando iniciei minha jornada no Eneagrama, fracassei miseravelmente ao tentar interpretar os subtipos através dessa espécie de “atalho” que seriam as variantes. Entendi todas as três, mas, mesmo assim, não fui capaz de interpretar os subtipos; apenas isso não bastou. No entanto, lendo os trabalhos de Naranjo, pude compreender tudo mais devidamente. Além disso, toda a análise ou “interpretação” apresentada nas proposições abaixo são baseadas na leitura dos mesmos trabalhos, na experiência de 22 meses de estudo e na tipagem de (atm.) 730 personagens, seguindo o formato Socionics-Eneagrama-Temperamento. Todas essas tipagens podem ser conferidas no Bestiário (BTR), de acesso livre no LinkTree ou no acesso da pasta Nº 6 do Acervo (Outros Documentos). Também vejo como necessário destacar que, da mesma forma que os instintos, todos os direcionamentos (e também os elementos relacionados) estão presentes na formação do tipo. Ocorre aqui uma hierarquia, um empilhamento, de modo que podemos explicar o funcionamento apenas pela prioridade, mas não podemos separar um direcionamento do outro.

Emocional — Paixão

Em sua variante emocional, as paixões buscam por atenção, boa imagem, controle e, sobretudo, integração social. Supondo que possuam a mesma natureza da tríade cardíaca, esta seria a primeira forma natural de uma paixão: há aqui um forte sentimento de carência, a partir do qual o indivíduo busca a validação emocional por meio de uma boa imagem — um eu falsificado, um personagem. No entanto, o tópico central deste direcionamento triádico, ao que me parece, é o apelo emocional para a validação/satisfação da paixão. Neste caminho, a paixão (o “vício emocional” ou a “cristalização”) é vivida em sua maior intensidade, pois não é encoberta pela intelectualidade ou pela ação. Por isso digo que esta é a “primeira” forma das paixões: o número três é o menor do triângulo, e a neurose se baseia justamente nele — no anseio, no desejo. Se na intelectualidade o indivíduo se distancia do objeto e na atividade o mesmo se funde ou, em certa medida, se projeta nele, aqui o direcionamento é especialmente objetivo: o indivíduo deseja, e isso não é, de modo algum, defendido pela psique. Por exemplo, o SX8 é o mais dominante, o mais histriônico e o mais poderoso dos E8s; sua luxúria não é desviada/encoberta ou justificada, portanto, a rebelião se torna ainda mais crucial. O mesmo se dá no SX2: este é o mais sedutor entre os E2s, e o mais impulsivo, também podendo chegar a ser agressivo para conquistar aquilo que deseja — perante a força ou a sedução. E o caso mais especial parece ser o do SX1 (contratipo): ele não se submete a padrões sociais; em vez disso, questiona a autoridade, e se impõe sobre seu desejo real contra o mundo. Diferente do SP1 tenso, controlado e esforçado, ou do SO1 inadaptável e missionário, o SX1 assume completamente seu ideal de perfeição — e o persegue. É um nadador profissional no que compete a ir contra o fluxo do rio. É o mais forte, o mais visceral: nunca se dobra. Aqui, a raiva parece buscar menos pelo disfarce da boa intenção. Este é o E1 que mais exige, que mais grita e mais critica.

O desejo é, portanto, o caminho tortuoso através do qual a paixão conduz uma caça rumo à completude de seu ser. Mas não necessariamente a emoção remete a intensidade ou força; observemos o SP6 e o SO4, por exemplo: o SP6, com medo do perigo, desenvolve um apego emocional, e a imagem que passa a construir é a de alguém fraco. Apegando-se, ele obtém uma proteção capaz de livrá-lo do medo. E o SO4 age de modo semelhante: ele é o E4 que mais sente a carência proveniente da comparação (inveja), e, portanto, também é aquele com a introjeção mais visível. Se no SX4 a introjeção é compensada pela suposição de que mais vale devorar o outro do que se submeter a ele e, no SP4, essa ira é “superada” através do esforço e do masoquismo, no SO4 não há nenhuma defesa contra o ataque da neurose, e as raízes da fixação são, portanto, nutridas. Assim, o SO4 se sente fraco, carente, e se apresenta como tal — “Eu já sofro tanto… Por favor, não me ataque! Veja, como sou fraco! Veja, como sou digno de piedade!”, ele parece pensar.

Nos tipos cardíacos em geral, a emoção parece ter um destaque ainda maior. O SO4 já foi descrito. Quanto ao SX2, acho justo interpretá-lo como “o mais livre dos orgulhosos”. Como sua emoção é plenamente vivida, ele desfruta de toda a intensidade e abundância. Existe um prazer no movimento, na folia, na intensidade emocional e na aventura. Este é muito diferente do E2 intelectual da esfera social ou do E2 ativo da esfera preservacionista. Não é nem manipulador e nem alguém afável para satisfazer seu orgulho e sua necessidade de ser amado. O amor é percebido através da intensidade emocional, da sedução, de uma espécie, até, de dominância sobre o outro. O SX2 se sente indispensável (i.e., orgulhoso) através da sedução constante; nele, a “doação” é de uma energia sexual intensa, poderosa. Enquanto isso, o SX3 tem, mais do que tudo, uma necessidade de receber o amor através da construção de uma imagem emocional moldada ao mundo. Ele pode ser tímido, ou agir como se fosse poderoso. Ele vive com o objetivo de agradar aos outros, seja ou não consciente disso, seja ou não através da intimidade (alguns também encontram prazer no poder ou no status), pois é isso que ele verdadeiramente “vive”: um papel, uma vaidade. Também podemos observar especialmente nele uma clara “submissão” à paixão. A orientação emocional faz com que o indivíduo esteja completamente vulnerável ao seu vício. Interpretativamente, é como se o jogo principal do ego do indivíduo ocorresse numa sessão de BDSM: ele está completamente amarrado, nu; está indefeso, sujeito a tudo que a paixão considerar mais prazeroso ou adequado realizar.

Intelectual — Fixação

Em sua variante intelectual, as paixões buscam por conhecimento, uma vez que a certeza traz a segurança — necessária para a ação. Supondo que possuam a mesma natureza da tríade cerebral, esta seria a segunda forma natural de uma paixão: existe um sentimento de ansiedade e dúvida em relação ao mundo externo, de modo que o indivíduo se afasta e existe dentro da própria mente, investindo o máximo de energias possível em formas de intelectualidade que facilitem o acesso à sua neurose. Por exemplo, o SO1 é o E1 mais raivoso entre todos: aqui, a atitude de “ir contra o fluxo” é a mais forte, concedendo-o o título de “inadaptabilidade”; o sentimento de superioridade é o mais reconhecido, sendo acompanhado por um senso de orgulho sobre o próprio valor, pois há uma rigidez em relação à aceitação e à abertura.

Partindo para outro centro, observemos o SX4: Ele é descrito como o mais literalmente invejoso entre os E4s. Mas por quê? Ocorre, aqui, que a inveja, o sentimento de carência, que deveria causar uma tormenta existencial no indivíduo, é “superada” através da intelectualização dos valores presentes na comparação: ele odeia, e então destrói; ele inveja, e então devora. A inveja, aqui, é veemente; é como se o indivíduo rejeitasse a introjeção natural do E4, decidindo se expressar como, quando e na força que desejar ou sentir que deve — o choro é substituído pelo grito. Então, em vez da introjeção das próprias dores e carências, existe um julgamento de que é melhor devorar o outro e se fortalecer com aquilo que toma. É interessante, ainda, observar como o SO2 também é o mais inesperado dos E2: não é necessariamente consciente de seu desejo, mas se move em direção a ele com inteligência e manipulação — uma sedução social.

Nos tipos cerebrais em geral, o intelecto é ainda mais proeminente. No SO7 (contratipo), a busca por segurança se manifesta no disfarce do oportunismo e do hedonismo da gula. Ambos aparecem na aventura mental: seu fascínio é pela informação, e o prazer está na obtenção de uma posição de facilidade social através do poder do conhecimento e da disponibilidade de sua criatividade a serviço da sociedade. Já o SO6, é aquele onde a dúvida e a projeção aparecem de forma mais evidente. Diferentemente do SP6, que demonstra ternura em busca de ser cuidado, o SO6 é altamente rígido e seus julgamentos são inflexíveis. E o SO5 é aquele que mais estuda, é aquele com mais foco no poder da informação — enquanto o SP5, por exemplo, está mais focado apenas na observação.

Ativa — Mecanismo de Defesa

Em sua variante ativa, as paixões buscam agir no mundo. Mas por quê? Supondo que sejam dotadas da mesma natureza da tríade intestinal, esta seria a terceira forma natural de uma paixão: o vazio existencial busca ser preenchido através da atividade/movimento no mundo externo, de modo que o indivíduo se esquece da própria interioridade e, com um objetivo implícito de conforto e espaço (pertencimento), segue aquilo que sua necessidade neurótica demanda. Parece confuso, mas, em síntese, é como nos tipos intestinais, onde impera uma necessidade de afirmar a própria presença através do movimento: um diminui o próprio ser em busca de harmonia, outro conquista a posição de autoridade através da perfeição, e o último impõe as próprias vontades com dominância — nota-se: são todas formas de buscar espaço. Por exemplo, o SP3 é um E3 que não se enxerga como vaidoso, mas como competente. Ele investe tudo na ação, e o controle é conquistado através do trabalho (ação), não da performa (intelecto) ou da adequação (emoção). O mesmo se dá no SP2, que não se vê como orgulhoso — ele é mais como uma criança carinhosa. E também no SP4, que tem sua carência implicitada pelo trabalho e pelo masoquismo.

Partindo para outro centro, podemos observar que o SP5 é o mais avarento entre os E5s. O isolamento aparece da forma mais característica imaginável, e o embotamento/adormecimento emocional é o mais forte possível. Seu processo de distanciamento do mundo acontece através de uma ação: a observação. Não são estabelecidos altos padrões que, se atingidos, permitiriam a abertura, e também não ocorre a divinização de um totem de conhecimento. Existe apenas uma observação e um constante acúmulo de todas as coisas. Da mesma forma ocorre no caminho intestinal do medo: Focado na ação e não no intelecto ou na emoção, o SX6 não é nem rígido e nem afável, mas é forte. Se o medo é a inibição da ação em decorrência da dúvida e do sentimento de fraqueza, o SX6 compensa tudo isso com uma marcada projeção do sentimento de medo contra o mundo, impondo suas vontades e seu movimento sobre os outros com um certo ar, até, de intimidação — e, nisso, lembra um E8. Mas o SX6 não é impulsivo, não: ele é altamente racional, crítico, julgador, ordenado. Uma vez decidido o seu caminho, nenhum obstáculo o paralisa. Enquanto isso, na gula, podemos observar o oportunismo em sua natureza mais lasciva: o SP7 obtém o que quer através da argumentação e possui uma ansiedade em relação às posses e a uma espécie de status. Ele é como o diabo, mas também como um dentista. Faz acordos tanto como se filia aos outros através da eloquência. Sua gula, em contraste aos outros rumos, é bastante aparente na busca por satisfações mais ligadas ao mundo material. E, seja ele um explorador ou um organizador, um planejador com síndrome de rebelde ou um advogado de língua veloz, sempre esconde na obtenção de vantagens o medo do fracasso — isso porque, no fracasso, não há posses, e sem posses não há segurança: e então, a morte passa a ser um tópico sobre o qual se tem ansiedade. O foco, portanto, é o planejamento: se ele parar, corre risco de vida.

E, de modo geral, nos tipos intestinais a ação tem um destaque ainda maior. No SP1, por exemplo, a raiva se torna bastante implícita, pois não há um olhar direcionado à imperfeição do mundo, mas à própria. Em vez de julgar ou de expressar e sentir com veemência seus desejos através da autoridade, o SP1 geralmente obtém respeito através da erudição, dos “bons modos”. A boa intenção, aqui, está em cada mínimo toque das etiquetas comportamentais que adere. O movimento contra o rio se dá nas águas do próprio ser: ele é rígido, é controlado (em todos os aspectos possíveis) e é tenso. Naranjo comentava que até a postura deste tipo de pacientes era rígida, estática — sólida. O SO9, por outro lado, é aquele que é mais relaxado e mais bondoso. Se a preguiça consiste num autoesquecimento, num mecanismo de narcotização para a defesa em busca de estabelecer harmonia nos ambientes, no E9 ativo a narcotização está no trabalho. Há uma espécie de “fusão”, mas não com pessoas (como no SX9), e sim com trabalhos. Ele foi descrito por Naranjo como um workaholic. Mas, de modo mais geral, o SO9 costuma ser o mais confluente; costuma agir conforme os padrões que se espera influenciarem a harmonia — seja controlando o humor do grupo, destacando as causas mais justas pelas quais se lutar, estando sempre disponível para ajudar os outros ou estando de acordo com padrões de bondade. A ação é o serviço aos outros, à sociedade. Por fim, temos o SO8, o mais ativo dos caracteres. Ele é como um E9, mas passa longe de ser narcotizado. O desejo pela ação é plenamente vivido, muitas vezes colocando-se a serviço de um grupo, trabalho ou ideal. Pode ser um policial, um herói ou uma figura admirável por sua força. Se a intelectualidade (pode-se dizer) aceita o egoísmo e a posição antissocial e, por outro lado, a emoção busca dominar e possuir através do fascínio e da intensa manifestação da vontade, a matiz social desvia tudo isso da consciência do indivíduo à medida que este se coloca a serviço

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