Ecos — 27.04.24

Esteja eu na superfície ou na lacuna mais profunda, sempre ouço os ecos. De fora do Abismo, sinto-me péssimo. Ouço vozes distantes e sem rosto. Mesmo que eu me sinta mais normal de fora, sinto uma certa ansiedade em ouvir as vozes abafadas. Acontece que é um trauma real: não gosto de me sentir deixado de fora, gosto de saber de tudo.

De dentro, as vozes refletem nas paredes abissais e nunca retornam pra mim. Me sinto um morcego perdido num mundo sem obstáculos contra mim mesmo; mas, nessa infinitude, sinto que cresço sempre em baixa densidade. Solto meu grito, e ele corre solto por toda a fenda. Ele se multiplica, e nem sei mais qual é qual. É difícil interpretar tantas vozes diferentes de um mesmo violão desafinado e sem artista.

De fora, ouço a multiplicidade desses cantos. Embora menos torturado, sinto medo, sinto a morte, pois sinto a vida. Me sinto como se ouvindo uma família do lado de fora de sua casa. E às vezes brigam, às vezes jubilam... Mas só vejo suas sombras. Me pergunto se vale mais a pena sacrificar a visão ou os ouvidos.

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